“Comunidades quilombolas são parte fundamental da sociedade”

13 de maio de 2024 | Notícias, Um Grau e Meio

maio 13, 2024 | Notícias, Um Grau e Meio

Por Sara Leal*

Em entrevista publicada na newsletter “Um Grau e Meio”, a pesquisadora Sirlene Barbosa, mestre em Sustentabilidade junto a Povos e Território Tradicional, doutoranda em Antropologia Social pela UnB (Universidade de Brasília) e parte da comunidade quilombola de Puris/Calindó (MG), fala sobre os desafios e contribuições dessas populações.

Assine a “Um Grau e Meio” clicando aqui.

A produção é gratuita e quinzenal, de autoria do IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), com abordagem especializada e análises exclusivas sobre clima, meio ambiente e sociobiodiversidade.

IPAM: Como as comunidades quilombolas integram a ação climática global?

Sirlene: As comunidades quilombolas realizam o manejo tradicional, que consiste em práticas sustentáveis, de saber lidar com o cultivo sem impactar, preservando a biodiversidade local pois sobrevivem dela. Elas retiram suas sementes e ervas tradicionais de uma forma que não agride o meio ambiente. Também fazem uma vigilância, de certa forma, contra várias práticas Ilegais, como desmatamento e caças predatórias.

Quais são os principais desafios que os territórios quilombolas enfrentam atualmente?

São vários, mas o primeiro desafio é a falta de políticas públicas para esses povos. As comunidades tradicionais, como as quilombolas, são muito impactadas pelas ações climáticas. A minha comunidade, por exemplo, é abastecida pelo rio Calindó e, nesse período de seca, vem sofrendo vários impactos. As pessoas são obrigadas a se reestruturarem para não sofrerem tanto com a escassez de água, deixando de desenvolver suas culturas tradicionais. Muitas comunidades sobrevivem de poço artesiano e, em vários deles, a água é insalubre, por isso a importância do abastecimento de água potável. Outra questão é a manutenção nas estradas: muitas comunidades estão em locais de difícil acesso e, a depender do período, é ainda mais difícil de trafegar. Outro desafio é a educação de qualidade – muitas das nossas crianças utilizam o transporte escolar para sair da comunidade pois as escolas de Ensino Médio são fora do território. Também há falta de alimentação e moradia dignas, dentre tantos outros desafios.

Como a falta de proteção aos territórios quilombolas ameaça essas comunidades?

Essa falta de proteção dos territórios, baseada na falta e na morosidade da regularização territorial, tem um impacto muito grande pois deixa a porteira do território aberta para que grileiros adentrem nossos territórios e façam o que bem quiserem. Ficamos desprotegidos porque a sociedade brasileira possui um olhar diferenciado para nós, de marginalização, porque a maioria das comunidades são constituídas de populações negras. Isso está vinculado à questão da discriminação racial, do racismo ambiental e institucional.

Como o acirramento dos conflitos fundiários afetam as comunidades quilombolas?

As comunidades têm os seus territórios divididos por conta de conflitos e por isso elas não conseguem plantar, pois esses territórios acabam fragmentados e elas ficam com a pior parte, onde não tem água, por exemplo. Muitos fazem barreiras, criam cercas, colocam porteiras e a comunidade acaba tendo que fazer um desvio muito grande para poder passar para um outro local.

Quais são as medidas mais urgentes a serem tomadas para garantir a proteção das comunidades quilombolas?

A primeira coisa é a regularização fundiária. Regularizando os territórios quilombolas, eu acredito que diminuiria todos esses conflitos e impactos. Outra medida é a fiscalização das leis de proteção ao território e de proteção à identidade. A minha comunidade, por exemplo, é certificada desde 2006, mas a gente não sabe em que nível está o processo de regularização fundiária. Isso faz com que haja muita especulação e impacta muito a nossa vivência, nossos modos de vida, porque os invasores acabam tendo uma certa “proteção” e é como se nós quem fossemos os intrusos.

Como a sociedade, de modo geral, pode contribuir com a luta das comunidades tradicionais?

Primeiro reconhecendo as comunidades quilombolas, as comunidades tradicionais de modo geral, como parte pertencente e fundamental da sociedade. A partir do momento que a sociedade entende que existem povos e comunidades tradicionais no Brasil e que reconhece a sua luta, que sabe que são parte fundamental do nosso país, eu acho que já é um pontapé inicial. Muitas pessoas não enxergam a nossa luta e nos ignoram, não acham que isso é importante, sendo que nós, de povos e de comunidades tradicionais, nós, quilombolas, o que a gente faz não é só para o nosso modo de vida, não é só para nossa vivência, mas contribuímos com um planeta equilibrado, protegendo os biomas e sua sociobiodiversidade. Não fazemos isso só para a gente. Fazendo para a gente, a gente também faz para o outro, para a sociedade como um todo.

*Coordenadora de comunicação do IPAM, sara.pereira@ipam-staging.chama7.com
Foto de capa: João Victor Corrêa



Este projeto está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).

Saiba mais em brasil.un.org/pt-br/sdgs.

Veja também

See also

Teste 20250816 1605

Teste 20250816 1605

Lorem ipsum dolor sit amet, consectetur adipiscing elit. Aliquam vitae lorem consectetur ante scelerisque elementum. Duis feugiat sollicitudin aliquam. Curabitur justo enim, pulvinar nec convallis ac, porttitor quis urna. Etiam tincidunt fringilla odio in...